
No horizonte amniótico brinca uma criança, único habitante
de um país isolado. Mergulhado há vários meses num manto
húmido vai remando os dias com impaciência. Resvala em
movimentos acelerados, escarpando o desassossego de quem não
pode perder o tempo que ainda não começou. A cada dia que
passa vê o espaço onde deambula reduzido.
Já não se senta pacientemente no lugar que lhe escolheram para
crescer, precisa de mais.
Está farto deste Verão em que o sol aprisionado brilha do outro
lado da pele.
Quer abandonar este mar em que não se afoga.
Quer procurar a vastidão de ruídos que ouve do outro lado da
vida, onde ainda não pode viver.
Flutuam-lhe nos olhos semi-cerrados, cidades adormecidas que
sonha acordar.
Tremem-lhe no corpo húmido, ilusões que suplicam crescer.
De repente estica-se, com a convicção que basta desta paisagem
crepuscular que só lhe pode oferecer dias clonados.
Dá um pontapé na neblina, sacode a solidão.
Abre-se um rombo na pele, a água rouca pinga entre as pernas
do universo. Tem um sismo a pernoitar na respiração. Emigra
por um canal estreito que escreve o adeus ao país que tem que
matar.
Sai,
uma luz intensa segreda-lhe,
nasceste.
Poema do livro "O áspero hálito do amanhã"
de Alberto Pereira